domingo, 23 de setembro de 2012

Esquecidos - Parte VI.





Valkíria foi a primeira a despertar, assim que acordou e se mexeu um pouco o cachorro de Franz que tinha se aninhado em seu colo levantou a cabeça e ficou fitando-a nos olhos.

No mundo dos Preocupados durante muito tempo eles acharam que os animais eram irracionais, desprovidos de inteligência, mais tarde descartaram essa hipótese pois começaram a notar que não só eram inteligentes, como também tinham sentimentos.

Depois chegaram à conclusão que o que os diferenciava dos animais é que eles não eram providos de consciência.

Curioso é que muito antes de terem chegado a essa conclusão, uns poucos entre os preocupados já sabiam que se o psiquismo humano fosse um oceano, a consciência não seria maior do que uma pequena ilha perdida nesse oceano, talvez até menos perdida do que o nível de consciência que os Preocupados no geral tinham obtido em toda a sua existência.

Qualquer ser dotado de alguma inteligência que pudesse observar Valkíria e o grande cachorro de pelos escuros se fitando nesse momento, saberia que estavam lendo os pensamentos, tocando as suas almas, bem de leve, para não incomodar aqueles que ainda estavam adormecidos.

Valkíria, Franz, e todos que fazem parte da Casa do Gramado, não davam maior importância às classificações que os Preocupados insistiam em fazer, para eles, todos os seres são partes de um todo, um Universo infinito, vivo, pulsante.





Quando Franz acordou Valkíria já não estava mais ao lado dele, tinha ido ver a luz do dia do lado de fora da construção circular, muitos dos Esquecidos caminhavam pelas ruas, sempre atentos ao céu, ao vê-la só acompanhada pelo cachorro que permanecia ao seu lado, um pequeno grupo a rodeou, com gratidão o cão aceitava as carícias e atenção que lhe eram dispensados.

Franz se deteve por alguns instantes frente à parede de pedras que dias atrás Valkíria começara a polir, não demorou a perceber que não se tratava de uma pintura, pequenas pedras coloridas tinham sido incrustadas nas pedras maiores, formando um mosaico, ficou refletindo que as pessoas que tinham se dado a esse trabalho, o fizeram para que durasse muito, tanto quanto uma pedra poderia durar, sem dúvida era uma obra de arte lindíssima.

Os Esquecidos que estavam no interior da construção estavam vivendo uma experiência nova, ao menos para eles, ainda dormiam profundamente. Para não incomodar, Franz com o pequeno cachorro de Valkíria no colo, saíram à procura dela.

Na entrada da construção Franz a encontrou rodeada por um grupo de Esquecidos, que a observavam aparentemente sem compreenderem, com um pequeno pano ela estava retirando como podia a poeira que há muitos anos se acumulara nas pedras polidas da grande construção circular.

Franz se juntou a ela, com o intuito de a ajudar, diante da cena, os Esquecidos com a sua destacada característica de sociabilidade, ainda que sem compreenderem, se juntaram a eles.

Não demorou e as pedras coloridas incrustadas nas maiores começaram a revelar o mosaico.

Por um momento Franz e Valkíria se afastaram um pouco para apreciarem as figuras que surgiam, aos poucos os Esquecidos que estavam no interior da construção, foram acordando e, ainda que igualmente sem compreenderem,  se juntaram ao grupo que limpava as paredes.

Ao olharem-se nos olhos, Valkíria e Franz emitiram uma intensa luz azul, estavam lendo pensamentos, interromperam momentaneamente suas atividades, e junto aos Esquecidos voltaram ao interior da construção para se alimentarem e apreciarem a preciosa água.

Eles tinham assimilado o modo de se comunicar dos Esquecidos, olhavam-se intensamente, seus olhos brilhavam, compreenderam que os mosaicos não eram só uma obra de arte, eles contavam a história de toda uma civilização, tratava-se de um texto, escrito em uma linguagem universal, a ser transmitida a todos os povos.

Uma história mergulhada nas profundezas da mente de um povo que dado à precariedade e fragilidade de seu mundo tinha caído no esquecimento.






Depois de terem se alimentado e apreciado a preciosa água eles voltaram a limpar as paredes, alguns grupos de Esquecidos que caminhavam pelas ruas também se juntaram aos demais, enquanto outros se ocupavam observando o céu e, outros ainda, traziam alimentos e água para aqueles que estavam limpando as paredes da construção.

Em todos os espaços havia alguém polindo as paredes, já não havia mais espaço para que outros se juntassem a eles.

Pouco antes de anoitecer praticamente todas as paredes já revelavam seus mosaicos, tinha chegado o momento de irem descansar.

As imagens que se desvelavam contavam a história de toda uma civilização há muito esquecida.

Cansada Valkíria começou a ler os mosaicos, praticamente eram auto-explicativos, mas todos precisavam se alimentar e dormir.

Quando o dia amanhecesse cada um que tinha participado desse trabalho teria um sonho novo, diferente do cotidiano, brilhando em seus olhos.

Breve o mundo dos Esquecidos teria uma história revelada.

À medida que adormeciam uma luz azul escura encobria, ainda que parcialmente as luzes do céu que mesmo quando deveria ser noite apresentavam um brilho intenso.

Muitos asteróides que refletiam as luzes das estrelas, pareciam ter-se afastado ligeiramente e deixaram uma brecha no céu, revelando a escuridão do Universo e o brilho tênue de estrelas distantes.

A mais distante de todas com luz azulada, iluminava brandamente a construção circular que agora reluzia.

Já dormindo as faces de Franz e Valkíria eram banhadas pela luz azul, que mergulhados em um sonho profundo flutuaram pouco acima do centro da construção na qual trabalharam o dia todo.





Franz e os Esquecidos partilhavam sonhos semelhantes, eles se remetiam às imagens que se desvelaram à medida que a poeira era removida da construção circular, mas Valkíria sonhava com um tempo remoto, na época em que vivia em uma grande casa com uma janela que fazia frente a um jardim.

Sentada em um sofá folheava um livro, enquanto apreciava o jardim além da janela, esse livro só tinha imagens, eram mosaicos feitos com pedras coloridas, incrustadas em grandes paredes de pedras polidas.

No jardim via Franz, mas na época, como os Esquecidos não se recordava de que um dia tinham vindo da mesma estrela, a Grande Estrela Azul.

Atrás de si ouvia a música vinda de um piano, havia uma festa, de alguma forma ela sabia ser o centro dessa festa, mas seu desejo não era participar dela, sua atenção estava voltada à pessoa que no jardim fazia esboços em grandes papéis, da casa e seus arredores.

Em um momento ouviu a chamarem pelo nome, mas sentia o corpo paralisado, não conseguia se mexer, sentia-se em um tipo de transe.

Percebeu quando a festa foi interrompida e a música cessou,  várias pessoas ficaram ao seu redor, ouvia essas tentando falar com ela, Valkíria tentava se comunicar, mas a sua voz ficou sufocada em seu peito.

Não demorou e o médico da família chegou para socorrê-la, levada ao seu quarto, dormiu profundamente, o médico não tinha dúvidas, na época Valkíria era jovem e pelo que a medicina podia revelar seu corpo gozava de plena saúde.

Os Preocupado sempre tiveram uma peculiaridade, o hábito de classificar tudo, o corpo de Valkíria gozava de saúde... Como se o corpo pudesse ser separado de todos os demais elementos que compõe a vida.

Felizmente para Valkíria e para os Preocupados que vieram nas gerações seguintes, o médico tinha uma visão diferente da medicina de sua época, ele sabia que os sonhos, sentimentos, emoções... Também tinham uma função essencial na vida das pessoas.

Depois desse episodio Valkíria se tornou uma confidente desse médico, que confiou a ela conhecimentos que vinham de um continente distante, junto com o médico ela transcreveu esse conhecimento, deixando-o disponível às gerações que seguiriam, contando para isso com a ajuda de Franz, que só teria contato com tudo que ela transcreveu e criou, muitas décadas depois.

Valkíria despertou no meio da noite, lembrou-se nitidamente de seu sonho e da época que vivia na grande casa da janela que dava vista ao jardim.

Naquele tempo se sentia deslocada, como se não fizesse parte daquela época, ela sabia que faltava algo aos Preocupados, algo que eles procuravam incessantemente e que estavam impossibilitados de encontrar, uma vez que o que eles tanto necessitavam não podia ser encontrado fora deles, a falta que sentiam era da própria essência.

Da mesma forma, agora no mundo dos Esquecidos ela sentiu que ainda faltava algo a ser revelado, percorreu todas as paredes do interior e exterior da construção circular, mas não conseguiu identificar o que faltava.

Franz e os Esquecidos ainda dormiam profundamente, uma tênue luz azul cobria uma grande face do planeta.

Do lado de fora, a noite parecia mais escura do que até então tinha presenciado desde que tinha chegado a esse mundo, no horizonte, muito distante a luz da Grande Estrela Azul refletia na face de Valkíria.

Mais do que pensar, ela sentia a vida que pulsava intensamente ao seu redor.





Ainda que de forma lenta e gradual os Esquecidos estavam experimentando uma forma nova de viver, leves lembranças começavam a refletir faces que até então eles desconheciam.

Já há alguns dias não eram assolados por nenhuma queda de meteoros, ainda não tinham se dado conta, mas as noites começavam a ficar levemente mais escuras.

Não demorou e outras construções começaram a ser limpas e a revelarem seus mosaicos, todas elas contavam a mesma história, se havia diferenças eram demasiadamente tênues.

Ainda que sentisse falta de algo que não sabia explicar Valkíria começou a interpretar os mosaicos, Franz a acompanhava, e os dois cachorros também participavam, eram sempre boas companhias e queriam ajudar em tudo.

Os Esquecidos também auxiliavam já não pareciam mais aqueles que há poucos dias denotavam não compreender o que estava acontecendo.

Em muito pouco tempo todas as construções circulares estariam revelando a história de uma civilização há muito esquecida no tempo.

Franz e Valkíria tinham adquirido o modo de comunicação dos Esquecidos, já não precisavam mais das palavras, até mesmo os dois cachorros já não emitiam sons, mas seus olhares eram cada vez mais profundos, quando se fitavam seus olhos brilhavam intensamente, entre eles o olhar, a presença, traziam em si significados que as palavras já não podiam mais revelar.

Ao anoitecer, os Esquecidos que ocupavam as construções circulares mais distantes também adquiriram o hábito de visitar o mundo dos sonhos, aprendido inicialmente na construção em que Valkíria começou a polir as paredes.

E as noites se tornavam cada vez mais escuras. A Grande Estrela Azul, localizada próxima ao infinito brilhava intensamente, iluminado a face de todos que tinham adquirido o hábito de dormir, mas muito próximo havia uma outra grande Estrela, que a cada noite, na escuridão do Universo parecia crescer mais.

Quando estavam adormecidos a luz azul que emanava das construções circulares se tornavam cada vez mais intensa, envolvendo partes cada vez maiores do planeta.





Os mosaicos presentes nas paredes externas da construção revelavam um mundo repleto de estrelas, Valkíria ficou confusa, mas com a ajuda de Franz concluíram que talvez fossem mapas, revelavam o céu, mas pelo menos os mosaicos próximos à entrada não se assemelhavam ao céu que estavam acostumados a presenciar.

Já os mosaicos no interior nitidamente contavam histórias. Os Esquecidos não se cansavam de apreciá-los.

 Junto à entrada, no interior, um primeiro quadro mostrava pessoas aparentemente se despedindo, eram muitas, enquanto uma parte delas ficavam imóveis, exprimindo uma certa tristeza, os demais se projetavam aos céus, desaparecendo lentamente.

Aqueles que ficavam se juntavam em pequenos grupos, eles juntavam pedras e arquitetavam construções, eram as construções circulares sendo erguidas, à medida que as paredes eram levantadas, utilizando pedras menores, as pessoas as poliam, até que ficassem lisas e outros, usando objetos pontiagudos, faziam pequenos buracos nas pedras polidas, uniformes e com os mesmos tamanhos, seguindo esses, outros encaixavam pequenas pedras coloridas que formavam as figuras que agora Valkíria buscava compreender.

Depois que as pedras coloridas estavam encaixadas outros vinham na seqüência polindo-as, deixando a parede lisa e uniforme, Valkíria, Franz, os dois cachorros e também os Esquecidos observavam maravilhados todo esse trabalho.

Esse primeiro mosaico estava ensinando às pessoas como edificar essas construções, os detalhes impressionavam, Valkíria ficou confusa, pois não se tratava apenas de uma história de como era feita a construção, mas Franz a complementava, nos detalhes constava um tipo de esboço, com medidas precisas, apontando as formas e dimensões da construção toda, o nível de detalhes denotava que deveria haver algum propósito, nessas formas e dimensões, além do aproveitamento de terreno.

Franz pensou que seria interessante ver outras construções circulares para verificar se seguiam o mesmo padrão, enquanto Valkíria continuava tentando interpretar os mosaicos.



sexta-feira, 7 de setembro de 2012

Esquecidos - Parte V.





Após alimentar-se e desfrutar a preciosa água Valkíria sentia-se recomposta, não estava mais cansada, mas ainda se sentia sonolenta, desejava dormir, por outro lado queria achar uma forma de ir ao mundo dos sonhos sem provocar estranhamento aos Esquecidos.

De alguma forma estava adentrando no mundo deles e raras vezes se lembrava de outros lugares em que já vivera, e da própria Casa do Gramado.

Às vezes o mundo dos Esquecidos refletia a impressão de ser monótono, denotando poucas ou até nenhuma mudança e até mesmo uma escassez de rotinas, mas quando se estava imerso em seu cotidiano refletia uma riqueza sem fim.

Nos momentos em que estavam à mesa Valkíria notou o quão intensa era a comunicação entre eles, ainda que não verbalizassem qualquer palavra.

Olhavam intensamente nos olhos daqueles que os acompanhavam, Valkíria pensava: no mundo dos Preocupados, ainda que esses raramente falassem a respeito, sentia neles uma profunda solidão, aqui entre os Esquecidos parecia que esse sentimento não tinha nenhum significado.

Ainda que não se fixassem em nenhum grupo específico, as pessoas sempre estavam mudando nesses, todos denotavam uma profunda compreensão do que viviam e dos sentimentos presentes neles.

Entre os Esquecidos aparentemente não haviam conflitos, o que era uma constante no mundo dos Preocupados. Valkíria sentiu que uma das coisas que geravam os conflitos era manutenção das pessoas em um mesmo grupo, uma das formas que usavam para aliviar esses conflitos era conquistar coisas, os Preocupados tentavam contornar a angústia dos conflitos produzindo e consumindo cada vez mais, mas isso acabava unicamente por gerar ainda mais angústia e conflitos.

Já os Esquecidos por não se fixarem nem às pessoas nem às coisas não conheciam sequer o significado dos sentimentos gerados pelo conflito.

Por não se fixarem a lugares, também não tinham nenhuma necessidade de ter coisas, nada além do essencial para a existência. Há muito a vida lhes tinha ensinado que ela poderia provê-los com tudo o que era necessário.

Até então os Preocupados não tinham notado que as necessidades pelas quais passavam justamente eram provocadas pelo seu hábito de subtrair da natureza muito mais do que precisavam, essa ânsia é que provocava em seu mundo muitas vezes um estado de miséria para uma grande maioria, em detrimento à ostentação de uma pequena minoria.

Valkíria enquanto refletia entrou em uma espécie de transe, não estava nem acordada nem dormindo, seus olhos permaneciam fixos, olhando o vazio. Os Esquecidos que estavam à mesa voltaram seus olhares a ela, não conseguiam compreender os sentimentos que a envolviam nesse momento.

Lembrou-se de uma época longínqua, quando morava em uma casa provida de uma grande janela defronte a um jardim, em um tempo que tinha o hábito de sentar-se em um sofá em frente a essa janela e ficar lendo, a imagem de Franz nesse jardim fazendo desenhos, esboços da casa do terreno invadiu a sua mente.

Naquele episódio ela e Franz estavam separados por um lapso de tempo, mas a Grande Estrela Azul forneceu energia o suficiente para que no ambiente que permeava a casa, esse lapso pudesse ser rompido.

Uma tênue lua azul começou a envolver Valkíria.





Inicialmente Valkíria e na seqüência Franz, entraram em transe e começaram a flutuar, aqueles que os acompanhavam ainda que em lugares diferentes, ficaram atônitos e momentaneamente se desviaram de suas atividades e se centraram nos dois.

Lentamente Valkíria flutuou para fora da casa onde tinha se alimentado, chegando à rua, quem estivesse um pouco distante poderia ver ambos flutuando pouco acima da calçada onde habitualmente os Esquecidos caminhavam sempre olhando para o céu, mas dessa vez seus olhares estavam fixos neles.

A luz azul que os envolvia se tornava mais forte à medida que se aproximavam, ambos continuavam em transe, um estado intermediário entre o dormir e o estar acordados.

Não tardou e eles ficaram entrelaçados, flutuavam na altura da copa das árvores, o pequeno cachorro de Valkíria e o maior de Franz se aninharam embaixo deles, ambos estavam sonolentos, um pequeno raio de luz azul os envolveu como se estivesse protegendo os sonhos deles.

Os Esquecidos não tinham dificuldades em absorver os acontecimentos que os envolviam, exceto pelos meteoros e meteoritos que constantemente caiam dos céus, desconheciam qualquer outra coisa que representasse algum risco a eles.

Passado o estranhamento inicial voltavam às sua atividades.

Franz e Valkíria permaneceram por dias no mesmo local entrelaçados, tinham muitos sentimentos a partilhar.

Sempre algum dos Esquecidos levavam água e frutas a eles, mas onde estavam não tinham como alcançá-los, deixavam por perto, mas esse alimento e água acabavam por suprir os dois cachorros que não saiam de perto deles.

Logo alguns dos Esquecidos também vieram a se alimentar na proximidade deles, parece que se sentiam melhor em não deixar os dois e os cachorros sozinhos.

Em uma noite alguns pequenos meteoritos começaram a se aproximar, vindo na direção onde Franz e Valkíria agora viviam.

Os Esquecidos denotaram aflição a maioria deles já haviam se mudado de vila para um local distante, mas alguns grupos deles se juntaram ao redor deles, desejavam intensamente chamar a atenção de Franz e Valkíria, precisavam sair daquele lugar, mas por mais que se esforçassem não conseguiam fazer com que eles saíssem do estado de transe.

Parece que pela primeira vez os Esquecidos viviam um dilema, mas aqueles que tinham se agrupado ao redor de Valkíria e Franz não os deixavam, até então os Esquecidos não conheciam o sentimento de risco, ainda que isso os afligisse, a idéia de deixar alguém do grupo para traz não fazia parte daquilo que conheciam.

À medida que os meteoritos se aproximavam a luz azul se tornava cada vez mais intensa e além de envolver Franz, Valkíria, os dois cachorros, também envolveu todos os Esquecidos que tinham ficado junto a eles.

Quando os meteoritos começaram a rasgar a atmosfera a luz que os envolvia se expandiu também, até os limites dessa, lançando de volta aqueles pequenos corpos celestes à escuridão do Universo.

Os Esquecidos que se distanciaram do local que seria atingido, mesmo de longe conseguiram ver a intensa luz azul que brilhou, quando retornaram só notaram uma tênue luz envolvendo Valkíria e Franz que continuavam em transe, e os dois cachorros, que sonolentos não se afastavam deles.

Aqueles que ficaram todos estavam bem, sequer lembravam do ocorrido, parece que quando a luz os envolveu, também entraram em transe.

Não tardou e trouxeram água e frutas para eles, mas o transe não cedia, o pequeno cão de Valkíria e o maior de Franz se deliciaram.





Os poucos Esquecidos que ficaram ao redor de Franz, Valkíria e seus cachorros, formaram um pequeno grupo, que agora pouco se mesclavam com os demais, seus sentimentos e atividades já não mais se  assemelhavam aos dos outros.


Aparentemente já não sentiam tanto a necessidade de ficar olhando para o céu.

Ocuparam a casa mais próxima de onde Franz e Valkíria, ainda em transe flutuavam. Saiam juntos da casa em busca de alimentos e água e também começaram a passar parte significativa de seu tempo junto aos cachorros, e sempre levavam frutas e água para eles.

Essa mudança de atitude estava chamando a atenção dos demais, que quando os encontravam, momentaneamente desviam o olhar do céu e observavam o curioso grupo que estava se distinguindo dos demais.

Aos poucos outros também começaram a se aglomerar junto a eles.

A parte da cidade que alguns dias atrás tinha sido destruída,  antes de Franz e Valkíria se reencontrarem agora estava quase que totalmente reparada, praticamente não havia mais vestígios do pequeno meteoro que tinha atingido aquela região.

À noite a tênue luz azul que agora envolvia aquela pequena parte da cidade aparentemente ficava mais intensa, uma sensação de prazer e tranqüilidade tomava conta daqueles que ficavam envoltos por ela.

Como esses poucos Esquecidos não mais se afastavam de si próprios e do local que agora ocupavam, começaram a experimentar um sentimento novo, aos poucos estavam sendo tomados pelo sono, não compreendiam o que estava acontecendo, lutavam contra essa sensação, alguns chegaram a pensar que estavam adoecendo, por outro lado a sensação de bem estar que sentiam quando envoltos pela luz azul os levavam a rejeitar totalmente a impressão de poderem estar doentes.

A linguagem entre eles era substancialmente escassa uma vez que desconheciam as palavras, a comunicação se dava quase que totalmente na troca de olhares, e nesses predominavam os sentimentos, por isso para os Esquecidos praticamente não tinham  necessidade de maiores explicações.

Os Esquecidos sempre foram movidos pelos sentimentos e dado o jeito de eles serem, praticamente não conheciam dilemas, o que os levavam a não ter qualquer dificuldade em assimilar novas formas de ser.

Para eles um simples olhar, a presença, já traziam em si todos os conteúdos que se fizessem necessários.

Até então não tinham o costume de ficarem parados nas ruas, quando se cansavam ou tinham necessidade de se alimentarem se abrigavam em alguma casa, saciada a fome e a sede, voltavam às ruas, ou em busca de mais alimentos, ou para observar o céu para se precaverem por uma possível queda de algum outro meteorito.

Como Valkíria, Franz e seus cachorros, entraram em um estado de transe e os dois estavam fora do alcance deles, pelos seus costumes eles não podiam ficar excluídos de grupos, assim os Esquecidos também começaram a se agrupar ao redor deles, mesmo que fosse na rua.

Na concepção deles ninguém poderia ser excluído de algum grupo, estavam sempre cuidando uns dos outros.

Os dois cachorros que não se afastavam do local onde eles flutuavam, e aceitavam com gratidão a companhia e carícias daqueles que vinham fazer companhia a eles.

No momento em que mais uma noite se aproximava o transe entre Valkíria e Franz amenizou brandamente e, aos poucos os dois desceram de onde flutuavam o que despertou os dois cachorros. Os Esquecidos que estavam sentados aos redor se aglomeraram em volta deles formando um círculo, se fosse possível vê-los de longe transmitiriam a impressão de que estavam se abraçando.





Valkíria e Franz desceram até quase tocarem o chão, mas seus pés não chegavam nele, a tênue luz azul os envolvia, ficaram de mãos dadas, com os dedos entrelaçados, o pequeno cachorro de Valkíria denotou querer ficar em um de seus braços já o maior se envolveu com eles, bem pertinho, com os quatro juntos a luz em volta deles ficou mais intensa.

Lentamente começaram a caminhar em direção à construção circular presente no centro vila, a mesma que Valkíria começou a limpar as paredes, pouco antes da queda do meteoro que se dera naquelas proximidades.

Um leve calor ainda emanava da terra, proveniente do calor dissipado quando o meteoro caíra.

Os Esquecidos que tinham ficado ao redor deles os acompanharam, o grupo agora formado era muito maior que qualquer outro antes existente, esses já não mais olhavam para o céu.

Ao chegarem à construção circular, os Esquecidos que lá estavam estranharam a dimensão do grupo, em um primeiro momento fizeram menção de saírem, para ceder lugar àqueles que chegaram, mas antes disso a sensação de acolhimento os envolveu, o que os levou a mudar a sua intenção.

Os que estavam à mesa, já tinham se alimentado, assim cederam o lugar aos que tinham acabado de chegar, mas Valkíria, acompanhada de outros subiram às partes altas da construção, seu pequeno cachorro agora estava envolto em seus braços.

Franz junto com outros, ficaram observando o que se assemelhava a uma pintura, na parte da parede que tinha sido polida, não teve dúvidas de que elas ocupavam todas as paredes da construção, acreditou que de alguma forma tinha relação com a história dos Esquecidos.

Na parte superior da construção os Esquecidos que fitavam o céu viram alguns meteoros que vinham rapidamente na direção deles, provavelmente cairiam em um lugar distante de onde estavam, mas começaram a se movimentar, para abandonar o local onde estavam, nitidamente a intenção era determinar a posição que seria atingida, e já se preparavam para fazerem o que fosse necessário.

Valkíria flutuou no centro da construção alguns metros acima dela, os meteoritos já estavam rasgando a atmosfera do planeta, deixando um rastro de fogo por onde passavam, mas isso abria um espaço no céu através do qual uma intensa luz azul atravessava.

Essa ofuscou a luz de todas as demais estrelas, vindo a envolver toda aquela face do planeta, lentamente os meteoros que se aproximavam desviaram o seu curso e se afastaram do planeta, sendo lançados na escuridão do Universo.

Lentamente a brecha deixada por eles foi-se fechando dando lugar ao intenso brilho das muitas estrelas existentes naquela parte da galáxia, mais uma vez ofuscando a luz da Grande Estrela Azul.

Franz que tinha subido para fazer companhia a Valkíria, viu aos poucos o brilho de sua estrela se ofuscar, sentiram uma intensa saudade do local que um dia eles se desprenderam.

Os dois desceram lentamente, como a escada estava vazia, puderam fazer isso um ao lado do outro, de mãos dadas, olhando nos olhos, lendo pensamentos.

Ao chegar no piso inferior ficaram por um longo tempo observando a pintura na parede, era lindíssima, mas estavam sonolentos, os dois cachorros já estavam dormindo, o menor de Valkíria estava envolvido, junto ao que sempre acompanhava Franz.

Valkíria se aninhou nos braços de Franz, logo estariam sonhando. Os Esquecidos que os acompanhavam já não mais estranhavam esse hábito, ficaram em silêncio em volta deles, de alguma forma também estavam experimentando um estado de transe, ainda que não fosse propriamente um sonho.





Franz e Valkíria já não se importavam mais com a privacidade, de certa forma estavam absorvendo pelo menos em parte a forma de ser dos Esquecidos, evidentemente a recíproca também era verdadeira.

Habitualmente no Mundo dos Preocupados havia dificuldades em lidar com diferenças, mesmo quando essas eram em relação a eles mesmos, talvez por isso vivessem em grupos tão fechados, sempre que havia discrepância de idéias as discussões ficavam acaloradas, algumas vezes até chegavam a desencadear guerras.

E mesmo nos grupos pequenos os desentendimentos eram freqüentes, o que os levavam a formar grupos cada vez menores, muitas vezes chegavam ao completo isolamento, mesmo quando viviam rodeados de muitos.

Essa era uma dificuldade que parecia inexistir entre os Esquecidos, todos viviam uma condição que lhes era comum, o risco de os meteoros os atingirem, aprenderam a viver em grupos para se protegerem, mas não tinham qualquer dificuldade em aceitar formas diferentes de ser, no principio trazia-lhes uma certa curiosidade, mas a empatia entre eles estava entre os sentimentos que predominavam.

Valkíria e Franz estavam sonhando, sentiam saudades da Casa do Gramado e de toda a magia que a envolvia, desejavam estar entre os menores, de alguma forma no sonho sentiram que tinham sido eles que os trouxeram a esse estranho mundo.

Desejaram estar na varanda, balançando em sua cadeira, com os cachorros, ou outros bichos, os menores e os demais seres encantados que faziam parte daquele mundo.

Sentiam-se aconchegados com as árvores que os envolviam à noite, sempre com o cuidado de deixarem uma pequena brecha para que a luz azulada da Grande Estrela iluminasse a varanda e a face de todos eles.

Percebendo o sono deles; os cachorros dormiam profundamente, descansavam as suas cabeças nos colos de Franz e Valkíria, nessa noite tinham trocado as posições o maior tinha se aconchegado junto a ela; os Esquecidos que estavam na construção circular ficaram em silêncio, ao notarem que a luz que os envolviam se tornava mais intensa também se deitaram ao redor deles.

Era a primeira vez que estavam experimentando o sono, seus sonhos seriam breves, apenas resquícios do que tinha sido os momentos anteriores, mas quando acordassem lembrariam de uma forma diferente de viver, ainda iria demorar para conseguirem atribuir significados a essa vida que permeia os sonhos.

Enquanto dormiam a luz azul que os envolvia ampliou-se até os limites da atmosfera, atingindo parte significativa da face do planeta.

Naquela noite os Esquecidos que caminhavam pelas ruas e ocupavam outros prédios circulares presenciaram uma noite com o céu especialmente agitado, puderam ver muitos meteoros se movimentando, alguns deles vindo em direção ao seu mundo, mas sempre que se aproximavam um pouco mais eram desviados e lançados nas profundezas do Universo.








sábado, 25 de agosto de 2012

Esquecidos - Parte IV.





Ainda que os Esquecidos não emitissem nenhum tipo de palavra, a comunicação entre eles se dava quase que totalmente através dos olhares e, ainda assim eram poucas as vezes que eles se olhavam nos olhos, uma vez que na quase totalidade do tempo seus olhares estavam voltados ao céu, não demorou para que Franz começasse a imaginar o por que desse hábito.

No primeiro dia em que se viu na cidade dos Esquecidos, que naquele momento estava deserta, ao entardecer, pouco antes de se recolher para ir ao mundo dos sonhos, em busca de Valkíria, Franz presenciou alguns meteoritos rasgando o céu.

Agora entre os Esquecidos, observando o céu logo notou que muitos dos inúmeros pontos brilhantes não eram estrelas, Franz imaginou estar em uma região do Universo repleta de poeira estelar, que à medida que fossem se juntando, nos milhões de anos que se seguiriam acabariam por formar planetas e até possivelmente algumas estrelas.

Franz sabia estar em uma região extremamente tempestuosa do Universo.

Sabia que era comum nesse planeta a queda de pequenos meteoritos e talvez até outros de porte maior, isso sem dúvida constantemente produzia danos significativos ao mundo dos Esquecidos.

Franz acreditou que o olhar dos Esquecidos sempre voltado ao céu tinha a função de localizar possíveis quedas de meteoritos, e assim evitar na medida do possível que esses ceifassem as suas vidas, isso fazia com que eles estivessem mudando constantemente os locais em que vivam, como a cidade que achou desabitada, devia haver inúmeras outras semelhantes, assim como tantas outras habitadas.

Como ocorreu com Valkíria, Franz também estava curioso em relação às inúmeras construções circulares presentes nos centros das vilas.




Quando estava anoitecendo, ainda que as diferenças fossem sutis, mesmo à noite, no mundo dos Esquecidos o céu brilhava intensamente, Valkíria achou que o céu naquela parte do Universo era permeado por estrelas, mas sentiu falta da Grande Estrela Azul, o céu era mais colorido à noite, ainda que houvessem estrelas com luz azulada brilhando, nenhuma delas se assemelhava àquela em que ela, num dia quando o Universo ainda era diminuto, tinha se originado.

Até então, ela, Franz, seus cachorros, a Casa do Gramado, e muito do que agora constitui esse Universo expandido, eram um único ser, mesmo o Tempo ainda não existia, quando a Casa do Gramado e tudo que a constitui se desprendeu da Grande Estrela Azul é que o Tempo e o Espaço tiveram a sua origem, lá no infinito, onde os dois se encontram.

Valkíria estava sonolenta, desejava muito dormir e chegar ao mundo dos sonhos, imaginando que assim poderia se aproximar de Franz e de sua casa, a Casa do Gramado, mas sabia que isso provocaria estranhamento aos Esquecidos, não sabia como, mas queria achar algum lugar em que pudesse estar sozinha para poder dormir, mas não imaginava como conseguir isso, os Esquecidos até onde sabia em nenhum momento ficavam a sós, toda vez que ela tentava ficar sózinha logo outros se aproximavam para fazer companhia.

Antes de procurar alguma privacidade Valkíria decidiu ver o que achava ser inscrições e, com um pouco de água e um pequeno pano que encontrou começou a retirar um pouco da poeira incrustada nas pedras, diferente do que pensou não se tratava exatamente de inscrições, mas se assemelhavam a pinturas, eram pequenas pedras coloridas, muito polidas formando um mosaico.

Valkíria achou aquilo lindíssimo, até esqueceu um pouco o seu desejo de dormir, logo vários Esquecidos se juntaram ao redor dela, denotavam alguma curiosidade, mas as feições deles eram de total incompreensão frente ao que ela estava fazendo, para eles não fazia qualquer sentido.

O desenho que se desvelava, sem qualquer dúvida era um planeta, circundado por inúmeros objetos estelares, em uma região do Universo intensamente povoada por estrelas, não demorou e Valkíria deduziu ser aquele o mundo dos Esquecidos, mas havia algo diferente do que até então havia presenciado, da superfície do planeta emanava uma tênue luz azul, que envolvia todo o planeta.

Quando estava concluindo a limpeza dessa pequena parte da parede de pedra, Valkíria se sentia exausta, mas pelo que tinha notado parecia que os desenhos ocupavam toda a construção circular.

Muito cansada deitou-se ali mesmo, aninhou-se no chão, os Esquecidos diante de Valkíria se sentiram totalmente desorientados, não imaginavam o que teria acontecido a ela, mas rapidamente limparam parte da mesa onde se alimentavam e a deitaram em cima dela, denotando inquietação pelo movimento o pequeno cachorro se aninhou junto aos braços dela, permaneceu atento por uns instantes, mas logo o sono também tomou conta dele.

Vários dos esquecidos permaneceram ao lado de Valkíria, querendo cuidar dela, mas simplesmente não sabiam o que fazer.




Já estava anoitecendo quando Franz julgou entender ao menos parcialmente as atividades dos Esquecidos, eles visitavam cada uma das casas, daquela parte da cidade, até então desabitada, se centravam principalmente em fazer pequenos reparos.


Durante o dia Franz caminhou por inúmeros quarteirões, a cidade estava constituída em uma região plana, assim não se cansava ao caminhar, em nenhum dos lados conseguiu visualizar os limites dela, mas por estar em uma região plana, não conseguia imaginar as suas dimensões.

Além dos reparos que faziam, os Esquecidos também se detinham em colher frutas das árvores plantadas no centro das ruas e nos espaços vazios entre as casas.

Chamou a atenção de Franz o extremo cuidado e zelo que eles tinham com as plantas e quaisquer outros seres, fossem eles vivos, ou até as inúmeras pedras de diversos tamanhos presentes nesse mundo. Como ocorreu com Valkíria, Franz se recordou do mundo das Trilhas.

Com essas eram construídas todas as habitações, mas sentiu que aqui tinham finalidades diferentes da do mundo dos Preocupados.

Os Esquecidos pareciam ser seres nômades, não tinham um lugar fixo para viver e suas casas não eram propriamente moradias, estavam sempre abertas e todos eram recebidos nelas, mas aparentemente só as usavam para descansarem brevemente e se alimentarem.

À noite Franz se sentia cansado, desejava dormir, visitar o mundo dos sonhos, acreditava que assim poderia achar uma forma de se encontrar com Valkíria, mas nas diversas casas em que entrou não encontrou nenhuma acomodação que pudesse usar para adormecer.

No meio da noite na mesa em uma das casas teve a certeza de que os Esquecidos não se comunicavam através da fala e, através dos olhares só notava o fraternidade presente em todos eles, queria dizer-lhes que desejava encontrar um lugar para dormir, mas mesmo com esforço não conseguia se fazer compreender.

Saiu às ruas na expectativa de encontrar algum lugar para dormir, mas em nenhum instante conseguia qualquer privacidade, ainda que eles não se fixassem uns aos outros, estavam sempre em pequenos grupos.

Quando já estava quase amanhecendo, a exemplo do que ocorreu com Valkíria se sentiu atraído pelas construções circulares presentes no centro das vilas, achou que nelas poderia encontrar respostas, mas nesse momento se sentia exausto e acabou por adormecer sentado, encostado a uma grande árvores no centro de uma das ruas.

Logo pequenos grupos de Esquecidos começaram a se aglomerar ao redor dele, o cachorro que permanecera o tempo todo ao seu lado denotava apreensão em relação ao movimento que se formava ao redor de Franz.






Pouco antes de o dia amanhecer Valkíria foi desperta por um intenso movimento no interior da construção circular na qual se encontrava.

Muitos estavam saindo às pressas, mas um pequeno grupo de Esquecidos permaneceram ao redor dela, quando ainda estava dormindo, estavam tentando levantá-la da mesa onde foi colocada quando adormecera e a levar com eles.

Foi esse movimento que a despertou, seu pequeno cachorro demonstrava ansiedade, não queria deixar que se aproximassem dela, o pequenino não conseguia compreender o que estava acontecendo, e Valkíria também não.

Ela sentiu alívio por parte dos Esquecidos quando acordou e se levantou, nesse momento já não havia mais ninguém na construção, além dela, seu pequeno cachorro e aqueles que estavam tentando carregá-la para fora.

Ao chegar à rua Valkíria presenciou um intenso movimento de pessoas, até então nunca tinha visto tantos nesse estranho mundo, todos andando rapidamente e curiosamente na mesma direção.

Desorientada e sem compreender Valkíria pegou seu cachorro no colo, que estava muito assustado e mesmo sem saber o motivo acompanhou os Esquecidos que tentavam se afastar rapidamente daquela parte da cidade.

Depois de caminharem por um tempo considerável Valkíria se sentia cansada e ainda sem fazer idéia sobre o por que daquela agitação. Ao olhar para o céu percebeu que logo o dia amanheceria, quando notou algo que imaginou ser uma estrela se movimentando na direção deles.

Não tardou a compreender, nesse momento, ainda que envolta na agitação dos Esquecidos percebeu que algum corpo celeste estava caindo do céu.

Ela entendeu que parte significativa dos objetos que via, principalmente à noite, não eram estrelas e sim meteoros e meteoritos, que refletiam a luz das estrelas que brilhavam mais distante.

Por isso os Esquecidos sempre mantinham os seus olhares voltados para o céu, o planeta deles devia ser constantemente atingido por esses corpos celestes, vindo a cair em suas cidades, assim sempre que percebiam a aproximação de algum deles se afastavam do local onde julgavam que poderia cair, salvando assim as suas vidas.

Nesse momento Valkíria sentiu um profundo sofrimento, ficou imaginando o sentimento deles, sempre tentando salvar as próprias vidas e assistindo aquilo que construíam sendo destruído.

Os pequenos grupos que estava se acostumando a presenciar agora tinha se transformado em um imenso aglomerado, estavam todos juntos, simplesmente se afastando de algo que cairia em sua cidade.

Um grande estrondo se irrompeu no céu, quando todos viram uma grande bola fogo caindo, agora estavam muito distante de onde no começo da noite Valkíria adormecera, pouco depois um barulho ensurdecedor atingiu a todos.

Ficaram alguns momentos sem ouvir nada, na linha do horizonte de onde tinha estado até então, Valkíria pôde ver uma mancha vermelha ardente, soube que esse era o lugar onde o meteorito tinha caído.

Todos estavam parados agora, aos poucos se sentavam para descansar, mas logo os menos agitados começaram a procurar por quem necessitava de ajuda.

Lentamente os pequenos grupos de Esquecidos começaram novamente a se formar, muitos deles procuravam pelas casas, eles precisavam se recompor, enquanto outros começaram a procurar por frutas nas árvores, outros grupos se formaram e voltaram a caminhar em direção ao local onde o meteorito havia caído.

Foi a um desses últimos que Valkíria, junto com seu pequeno cachorro se juntou, logo ela compreendeu que a finalidade era encontrar pessoas que tivessem ficado para traz ou se machucado no caminho.

Ainda que tenha encontrado muitas pessoas assustadas, felizmente nenhuma delas tinham ferimentos maiores, caminharam até quase o dia findar, estavam todos cansados e já começavam a retornar o que lhes era habitual.

Valkíria estava chegando próximo ao prédio circular onde tinha estado na noite anterior, mas notou que os demais não queriam ir além, quando tentou continuar a caminhar, notou que os Esquecidos não queriam que ela continuasse.

Ela insistiu e caminhou mais um pouco, o grupo de Esquecidos que estavam com ela ficaram olhando-a se afastar sem conseguirem compreender.

Olhando à sua frente Valkíria viu a terra ardendo em chamas, sabia ter sido o local onde o meteorito atingira a terra, mais uma vez sentiu a tristeza tomar conta dela.

Ao olhar para traz percebeu que o grupo de pessoas que estavam com ela não se afastavam, apreensivos a observavam, lentamente voltou a caminhar para se juntar a eles.

Cansados entraram na casa mais próxima, para descansar um pouco, tomar água e se alimentar.






Ainda que sonolento Franz não conseguia adormecer, o movimento dos Esquecidos ao seu redor não permitia, sentiu que eles não compreendiam o seu desejo, e também estava difícil conseguir alguma privacidade.

Com dificuldades pelo sono entrou em uma das casas, seu cachorro sempre o acompanhava. A grande mesa no centro tinha bastante água e frutas à vontade, assim que entrou aqueles que lá se alimentavam abriram um espaço para que ele se aproximasse.

A água acompanhada do alimento aliviou um pouco seu sono, enquanto se alimentava sentiu que para conseguir alguma privacidade e conseguir dormir precisaria despistar os Esquecidos de alguma forma.

A temperatura nesse mundo era bastante agradável, pelo que notou dificilmente conseguiria encontrar alguma casa vazia, mas entre elas sempre havia um terreno de tamanho semelhante com árvores e plantas, pensou que se conseguisse sair da casa sem ser notado conseguiria se esgueirar no terreno ao lado e dormir um pouco, não seria confortável, mas era possível.

Quando se levantou da mesa, dois dos Esquecidos que já tinham se alimentado se levantaram junto a ele, mas Franz não saiu da casa só se posicionou próximo à porta e como era hábito dos Esquecidos ficou olhando para o céu, como não saiu, os dois que se levantaram voltaram à mesa.

Sem emitir ruídos saiu em silêncio e se esgueirou para o terreno ao lado da casa, aqueles que estavam na casa e os grupos que caminhavam nas ruas, não notaram o seu movimento.

No centro do terreno havia uma grande árvore na qual Franz se recostou, ao seu redor havia muitos arbustos que o cobriam, assim não podia ser visto por aqueles que caminhavam nas ruas.

Franz ficou por uns momentos refletindo sobre esse mundo, sentia saudades da Casa do Gramado e principalmente de estar com Valkíria, mas passados alguns instantes adormeceu, seu cachorro ficou junto a ele e aninhou a cabeça em seu colo.

Pouco antes de amanhecer foi desperto por um estrondo, levantou-se assustado, junto com seu cachorro, mas não notou nada diferente nas ruas, em poucos instantes já estava mesclado em um dos grupos que como era habitual, estavam caminhando, mas dessa vez todos voltavam seus olhares para um ponto comum, no horizonte.

Franz viu a terra em chamas em um local muito distante, logo compreendeu, sabia que algum meteoro havia atingido a superfície do planeta, imediatamente seus pensamentos se voltaram para Valkíria e uma inquietação invadiu seus pensamentos, esse evento teria ferido e até tirado a vida de muitos dos Esquecidos.

Parte dos grupos dos Esquecidos começaram a se deslocar em direção ao local onde a terra estava em chamas, enquanto outros sem denotar qualquer estranhamento continuaram as suas rotinas, sempre caminhando com os olhares voltados ao céu, aparentemente só o estrondo desviou momentaneamente a atenção deles.

Franz resolveu se juntar a um dos grupos que caminhavam em direção ao local onde julgou ter caído o meteoro, andaram os resto da noite que já findava e praticamente todo o dia seguinte, ainda que nesse mundo a diferença entre o dia e a noite fosse sutil, mesmo à noite o brilho no céu era intenso, pelas muitas estrelas não muito distantes da estrela principal que alimentava o planeta e da poeira presente no espaço que refletia a luz das estrelas mais distantes.

No meio do caminho depararam com inúmeros grupos de pessoas que se afastavam do local onde o meteoro tinha caído enquanto outro número significativo deles voltavam. Franz logo notou que procuravam por pessoas feridas enquanto outros se ocupavam em fazer reparos.

À medida que se aproximava presenciou muitas casas destruídas, no caminho encontraram muitos dos Esquecidos assustados e com ferimentos leves, sem dúvida se machucaram quando estavam aglomerados tentando fugir, mas felizmente não havia ninguém com ferimentos maiores.

À medida que percebiam que as pessoas estavam bem, e aos poucos se acalmavam os Esquecidos iniciaram os reparos e reconstrução das casas destruídas.

Já estava quase anoitecendo, quando Franz começou a sentir-se mais leve, notou que seus pés praticamente não tocavam o chão enquanto caminhava, brevemente desviou o olhar do céu e olhou para as mãos e notou que uma tênue luz azulada as envolvia.

Franz sentiu que Valkíria estava nas proximidades.





sábado, 4 de agosto de 2012

Esquecidos - Parte III




Como Valkíria, Franz também se sentia cansado e sonolento, sentiu que não havia mais o que fazer naquele dia, queria encontrar Valkíria, mas sabia que à noite seria difícil.

Saiu uma última vez à rua, a noite já tinha chegado, mas o céu era muito brilhante, sabia que nem todos os pontos brilhantes eram estrelas, o céu que apreciava era muito diferente do mundo que conhecia.

Sentiu-se maravilhado diante de tanto brilho, só estranhou não ver sinal da Grande Estrela Azul, sentiu que se pudesse vê-la em algum lugar isso o ajudaria a encontrar Valkíria, mesmo sendo noite o céu estava ofuscado por tanto brilho.

No horizonte pode ver riscos no céu, eram meteoritos que rasgavam a atmosfera daquele mundo misterioso.

Voltou para a casa e em um canto dela procurou adormecer, não demorou e o seu cachorro que o acompanhava veio se aninhar próximo a ele.

Achou que talvez no mundo dos sonhos sua amada pudesse encontrá-lo.

Desejou intensamente estar com Valkíria, em seus pensamentos e sentimentos sabia que ela estaria com ele, de mãos dadas, caminhando bem lentamente, olhando nos olhos, lendo os pensamentos, a caminho do infinito, lá onde o espaço se encontra com o tempo, onde a Grande Estrela Azul brilha intensamente.




Praticamente sem sentir Valkíria se debruçou em cima da mesa, o sono era intenso, sem se dar conta adormeceu profundamente, assim que terminou de comer algumas frutas com muita água.

Os Esquecidos que ocupavam a casa ficaram assustados, não sabiam o que fazer, não estavam compreendendo o que acontecia com Valkíria.

O movimento dos Esquecidos deixou o pequeno cachorro de Valkíria apreensivo, ele se aninhou junto a ela e tentava afastar quem se aproximava, mas ele também estava muito cansado, e acabou por adormecer aos pés de Valkíria.

Logo o ocorrido na casa se espalhou entre os Esquecidos, que em grupos vinham de todos os lados, não entendiam o que estava acontecendo.

Ainda que Valkíria fosse uma visita, eles já não a reconheciam como tal, para eles Valkíria não deixava de ser mais uma habitante de seu mundo.

Logo um sonho veio habitar a mente de Valkíria, as imagens da noite anterior, quando descia o caminho de pedras foram as primeiras a surgir, junto veio o sentimento de voltar à Casa do Gramado, mas ela escorregava, o caminho era muito íngreme e ela não conseguia retornar.

Na seqüência viu-se entre os esquecidos, além de notar que eles estavam sempre atentos aos céu, também chamou a sua atenção que ainda que andassem juntos, eles não conversavam, só eventualmente desviavam o olhar do céu e olhavam-se, muitas vezes nos olhos e, para eles aparentemente os olhares já diziam tudo que era necessário.

Ainda em seu sonho, mais uma vez Valkíria se viu caminhando nas calçadas de pedras, mas era como se ela flutuasse, chamou a sua atenção, em especial, as construções circulares que tinham nos centros dos vilarejos, sentiu que deveria ir até essas construções, mas despertou.

Ao acordar muitos Esquecidos estavam ao seu redor, parece que desejavam cuidar dela, mas não sabiam como fazer isso.

Ainda que aparentemente o sonho tenha sido breve, muito tempo tinha se passado, o dia já tinha amanhecido, notou que as pessoas que agora estavam na casa não eram as mesmas que a tinham trazido, nem aquelas que lá estavam quando chegou, ainda que fossem todos visualmente estranhos, os sentimentos, em especial a gratidão, parece que continuava a fervilhar na casa e nos arredores.

Mais uma vez lhe ofereceram água e frutas, também não faltou alimentos para o pequeno cachorro de Valkíria, que continuava aninhado junto a ela.

Logo algumas pessoas começaram a sair pelas ruas, enquanto outras entravam na casa, parece que só entravam para descansarem, se alimentar e tomar água.

Valkíria também saiu, o cachorro a acompanhou, estava pedindo colo, não demorou e um pequeno grupo de Esquecidos se juntou a ela.




Franz adormeceu profundamente, não demorou e os sonhos vieram lhe fazer companhia.


Como Valkíria as imagens que presenciou durante o dia fervilhavam em sua mente, sentiu-se caminhando em uma cidade estranha, deserta, um sentimento de angústia tomou conta de seu sonho.

Queria encontrar o caminho para a Casa do Gramado e estar junto a Valkíria e ao seu mundo de sonhos, mas por mais que caminhasse pelas ruas de pedras lisas, totalmente desertas, não achava o caminho de volta.

Sentiu-se sozinho em um mundo estranho.

A imagem de meteoritos rasgando o céu surgiu em seu sonho, uma vez apagada a chama no céu escuro pensou ter visto uma tênue luz azul.

Uma dúvida veio a pairar em sua mente, sabia estar sonhando, e os acontecimentos recentes fervilhavam, mas ficou em dúvida, não se recordava da luz azul ter surgido após a passagem dos meteoritos.

Entrou em um estado de sono profundo, sua respiração era profunda e prolongada, no momento subseqüente viu-se em uma grande sala com uma mesa retangular em seu centro e várias pessoas ao seu redor, Valkíria dormia debruçada na mesa e seu dócil cachorrinho estava a seus pés, também dormindo.

Franz sentiu a inquietação daqueles que estavam ao redor de Valkíria, pareciam querer ajudar, mas não entendiam o que estava acontecendo.

Por outro lado achava importante dizer a Valkíria, ainda que não soubesse o por quê, que tinha visto um breve lampejo da luz azul, depois da passagem dos meteoritos, mas ele mesmo tinha dúvidas se tinha visto a luz.

Queria se aproximar mais de Valkíria, mas tinha dificuldades, naquele momento eram muitas as pessoas ao seu redor, mas sentiu que de alguma forma tinha estado perto dela, em seu sonho talvez ela o percebesse e assim, logo ela poderia mais uma vez encontrá-lo.

O cachorro de Franz que também tinha adormecido próximo a ele acordou e se sentiu inquieto, insistentemente mexeu em Franz para despertá-lo.

Franz também pensou ter ouvido ruídos do lado de fora da casa, já tinha amanhecido, mas quando saiu à rua ela estava deserta.

Sentiu que a presença de Valkíria estava impregnada em todo o seu redor, em toda a casa, e mesmo do lado de fora sentiu o perfume delicado de lavanda, que Valkíria sempre usava.

Desejou intensamente estar ao lado dela.






Valkíria estava se mesclando aos esquecidos, notou que havia mais pessoas do que tinha percebido anteriormente, andavam sempre juntos, em pequenos grupos, mas ainda que tivessem o habito de ficarem juntos, as pessoas dos grupos estavam sempre se alternando.

À medida que participava do cotidiano dos Esquecidos, Valkíria confirmou a sua impressão inicial de que eles não se comunicavam pela fala, praticamente não emitiam nenhum ruído além dos passos resvalando as calçadas de pedras lisas.

Os Esquecidos sempre estavam atentos aos céus, Valkíria não compreendia, mas percebia que eles a estranhavam por sempre olhar às pessoas, especialmente em seus olhos.

Aparentemente a comunicação entre os esquecidos prevalecia pelos olhares, quando desviavam ainda que rapidamente os olhares do céu, olhavam-se nos olhos, nesses episódios um leve sorriso brotava de suas faces, mas no instante seguinte já voltavam os olhares para o céu.

Muitas vezes um simples olhar, a presença, já dizem tudo o que é necessário.

Quando olhou novamente à sua volta Valkíria notou que nenhuma das pessoas que caminhavam com ela era conhecida, ela estranhava, mas para os Esquecidos isso não trazia qualquer incomodo.

Quando se deu conta o grupo de pessoas à sua volta se desfez, alguns entraram em uma das inúmeras casas, enquanto outros foram colher algumas frutas das árvores próximas.

Mais uma vez, Valkíria se viu sozinha, mas não demorou para que outros se juntassem a ela, chamou a atenção dela a atenção que os esquecidos tinham ao colher as frutas, tomavam extremo cuidado para não pisar ou danificar qualquer pequena planta que estivesse no chão, bem como ao retirar as frutas das árvores, o sentimento de gratidão deles transbordava em seus olhos.

Ela se lembrou daqueles que foram viver nas trilhas após o evento que se iniciou em “Trilha dos Desejos”.

Já estava anoitecendo, Valkíria se sentia cansada, mas ainda não compreendia o funcionamento desse estranho mundo, sentia que devia entrar em uma das casas, se alimentar, descansar e dormir um pouco, talvez os sonhos clareassem as suas idéias, mas sentiu-se atraída pelas construções circulares nos centros das vilas, achou que talvez nelas encontrasse respostas.

Quando deu por si, mais uma vez se viu só e resolveu ir à construção circular mais próxima, o dia já estava findando e Valkíria sentiu uma leve tontura, estava cansada, o dia tinha sido quente e resolveu sentar-se e respirar fundo esperando que a tontura passasse, não demorou e os Esquecidos a rodearam e a levaram para a casa mais próxima.





O dia já era claro quando Franz despertou e saiu para as ruas de pedras lisas. Atento, seu cachorro o acompanhou.


Não demorou e se deparou com pessoas que caminhavam pelas ruas de forma peculiar, sempre olhando para o céu.

Curioso Franz os imitou por alguns instantes, a iluminação era intensa, não conseguia precisar ao certo qual era a estrela mais próxima, eram muitos os pontos brilhantes no céu, diferente do lugar em que até então tinha habitado, que durante o dia apenas uma estrela de luz amarelada brilhava e, aquelas que via à noite, apesar de inúmeras estavam distantes, exceto a Grande Estrela Azul, que apesar de ser a mais distante de todas, tinha um brilho que sobressaia às demais.

Em um ímpeto Franz tentou se comunicar com os Esquecidos, desejava saber se tinham conhecimento de Valkíria e saber onde estava, mas foi recebido com estranhamento, eles não o entendiam.

Não demorou e o levaram para uma das casas, muito parecida com a que ele tinha dormido na noite anterior, logo trouxeram água e frutas, Franz teve a impressão que achavam que ele desejava se alimentar.

Logo aqueles que o trouxeram à casa saíram novamente às ruas, enquanto outros se juntaram a ele, na grande mesa no centro da casa, a qual sempre era suprida com água e frutas.

Franz estranhou que nenhum deles emitiam qualquer palavra, por outro lado parecia que se comunicavam intensamente através dos olhares.

O cachorro de Franz também estranhava o movimento, mas não se afastava dele, não faltou quem o acarinhasse e também oferecesse água e alimentos.

A fraternidade entre todos transbordava, o que deixou o cachorro de Franz totalmente tranqüilo e aceitava com gratidão o que lhe ofereciam.

Como Valkíria, Franz também não estava compreendendo esse mundo.






Após um ligeiro descanso Valkíria estava determinada a ir conhecer as construções circulares presentes nos centros das vilas.

Quando se levantou pegou seu pequeno cachorro nos braços e ele se aninhou a ela.

Dois dos esquecidos que estavam à mesa ao notar que Valkíria havia se levantado se juntaram a ela e se dirigiram às ruas, como já tinha notado ser um hábito dos Esquecidos em poucos instantes um pequeno grupo já estava montado, sempre ficavam juntos.

Ao se aproximar da construção circular algumas pessoas do grupo continuaram caminhando pelas ruas, e outras que estavam próximas ocuparam o seu lugar.

Na entrada da construção havia uma grande entrada em forma de arco, sem nenhum sinal de qualquer tipo de portão, no interior Valkíria se deparou com tipo de pátio de grandes proporções, em seu centro, como nas casas havia uma grande mesa que a exemplo das casas estava repleta de frutas e água, para quem desejasse, ao redor da mesa alguns esquecidos se alimentavam.

Pouco além do pátio havia uma escada em formato de caracol, que sem qualquer dúvida dava acesso às partes superiores da construção.

O grupo que estava com Valkíria se dispersou totalmente, alguns voltaram às ruas, enquanto outros, se dirigiram à escada.

Logo aqueles que estavam à mesa nitidamente com os olhares a convidaram para partilhar as frutas com eles, Valkíria aceitou, mas não desejava se alimentar, só aceitou um pouco de água com gratidão.

Seguido alguns minutos Valkíria se dirigiu às escadas, foi seguida por seu cachorro e por alguns que tinham acabado de se alimentar.

As paredes que circundavam as escadas eram de pedras, como a totalidade das construções no mundo dos esquecidos, mas aqui ela teve a impressão de que eram mais lisas, ainda que estivessem cobertas por poeira. Valkíria teve a impressão de que por baixo da poeira havia algum tipo de inscrição, desenhos... Forjados na própria pedra, mas o excesso de poeira a deixou em dúvida.

O vão da escada não era muito largo de forma que não mais que duas pessoas conseguiam andar lado a lado, como enquanto subia, outros desciam, pela primeira vez desde que estava entre os Esquecidos, ela conseguia caminhar sem alguém ao seu lado.

Valkíria se sentia grata pela companhia e carinho com que era tratada, mas em alguns momentos sentia necessidade de estar na companhia de si mesmo. Em um outro mundo ela tinha notado que a melhor companhia da qual podia dispor era a companhia de si própria.

Ao chegar ao topo da construção se deparou em um tipo de salão a céu aberto, ao seu redor, debruçados no parapeito da construção, vários dos Esquecidos olhavam ainda mais atentamente que aqueles que andavam nas ruas para o céu.

O pequeno grupo que estava junto a Valkíria ocupou os poucos lugares vagos no parapeito e ficaram como que estivessem de vigília, igual aos demais, olhando para o céu.

Valkíria resolveu descer, continuava com um entendimento restrito desse mundo, alguns que já estavam junto ao parapeito quando chegou se juntaram a ela.

Ficou com a impressão de que se pudesse entender as inscrições que achou que haviam nas paredes daquela construção conseguiria algumas respostas sobre esse mundo, desejou estar ao lado de Franz, sabia que ele teria mais facilidade em entender as inscrições, se elas estivessem lá, embaixo da poeira.