quinta-feira, 7 de julho de 2011

Essência: Um caminho para as estrelas - Parte V



Nos momentos que se seguiram os demais sistemas da base foram todos restabelecidos, mas ainda que tudo estivesse em funcionamento e, sem dúvidas potencializados, os motores apesar de não apresentarem nenhum dano aparente, continuavam inoperantes.

De acordo com a engenharia isso não fazia sentido, dado o tempo que tinha passado já deveriam ter entrado no campo gravitacional de alguma estrela e, sem os motores para impulsioná-los em breve entrariam em rota de colisão com o corpo celeste que os atrairiam, mas de acordo com os sensores ainda estavam no mesmo lugar em que se encontravam quando foram atingidos pelo raio de luz, isso desafiava as leis da física até então conhecidas.

Outro aspecto sem sentido é que os indicadores de energia disponível apontavam o máximo da carga possível e, ainda que estivessem consumindo essa energia, ela não decaia, mesmo sem uma fonte que a alimentasse, que de acordo com o projeto da base era fornecida pelos motores, agora inoperantes.

As tentativas de entrar em contato com o novo “tripulante” até então tinham sido infrutíferas, não era composto de nenhum material conhecido e, nenhum dos sensores existentes conseguia detectá-lo. Os demais já estavam se acostumando com a sua presença ainda que não soubessem o que fazer com ele, começavam a se dar conta de que essa relação talvez fosse inversa, tinha surgido uma questão, o que essa criatura estaria fazendo com eles.

Em comum acordo, aqueles que ocupavam postos de comando na base decidiram não entrar em contato com as demais bases ou espaçonaves, não conseguiam explicar o que estava acontecendo e, temiam que o que lhes tinha ocorrido poderia atingir os demais, caso interferissem.

Como até então esse novo “tripulante” não tinha provocado nenhum risco aos demais em consenso decidiram não usar nenhuma forma hostil de aproximação, mas usariam tudo que lhes era possível para se comunicarem e tentar entender quais eram as suas intenções.



Quando ocorreu a tempestade solar que atingiu o mundo das preocupações, ainda que tivessem sido acometidos pela maior crise até então conhecida, dado que essa tempestade tinha provocado um colapso praticamente total nos meios de comunicação, mais uma vez os preocupados perceberam que é nas crises que surgem as grandes soluções, isso por que no mundo das preocupações as pessoas são movidas pelas próprias preocupações e, na ausência de preocupações eles entram em crise, assim surgem novas idéias que na seqüência geram novas crises e assim vivem nesse ciclo de crises e novas soluções que geram outras crises.

Nesse evento em particular quando conseguiram capturar uma pequena partícula do plasma solar e com esse descobriram uma forma até então inesgotável de energia para alimentar os seus motores, isso possibilitou a eles alcançarem as estrelas.

Parte da energia que era utilizada para movimentar os motores de suas bases espaciais e espaçonaves era desviada e transformada para alimentar os demais sistemas existentes, assim a energia de que dispunham era ilimitada, mas dependiam do funcionamento dos motores para que os demais sistemas fossem alimentados.

Os técnicos não estavam conseguindo resolver esse paradoxo, como era possível que os demais sistemas funcionassem se a fonte de energia que os alimentavam estavam inoperantes.

A única possibilidade que podiam pensar é que esse novo e estranho tripulante que agora transitava entre eles era a fonte que os estavam suprindo e, continuavam perplexos pois em suas tentativas de entenderem quem era e suas intenções ainda que pudessem vê-lo circular pela base, nenhum dos sensores de que dispunham conseguiam detectá-lo, de acordo com a tecnologia de que dispunham aquele ser não estava na base, contrariando aquilo que todos estavam vendo.

Nesse meio tempo receberam a comunicação de outras espaçonaves que detectaram os seus problemas, quando foram atingidos pelo raio de luz e, por algum tempo ficaram totalmente inoperantes, esse fenômeno tinha emitido um alerta a todos os demais que vagavam entre as estrelas. Diziam que a ajuda estava a caminho.

Preocupados sinalizaram que estavam bem e pediram que uma única espaçonave se aproximasse para o caso de necessitarem de ajuda, mas que mantivessem uma distância segura, uma vez que até então não tinham explicações sobre o que estava acontecendo, e não era prudente que outros corressem riscos.



Para os preocupados a segurança sempre foi uma questão central, o curioso é que sempre que criavam um novo sistema de segurança, havia outros preocupados que se ocupavam no sentido de  burlar essa segurança, assim, também nesse sentido viviam em um círculo vicioso, estavam sempre destinando recursos e energia para manter a segurança e sempre havia aqueles que se ocupavam para quebrar essa segurança, fazendo com que em muito pouco tempo os sistemas de segurança se tornassem obsoletos.

Ainda que tivessem alertado que tudo estivesse bem e, os sistemas da base operassem com uma eficácia até então desconhecida, acharam prudente manter uma outra espaçonave nas proximidades para garantir a segurança, mas ao mesmo tempo a uma distância segura para que não fossem afetados pelo mesmo fenômeno que os atingira, pelo menos até que tivessem um entendimento maior do que estava ocorrendo.

Em sua primeira comunicação quando a espaçonave tinha se aproximado, perguntaram à base qual era a origem da fonte do luz que os estavam rodeando, como resposta a mensagem foi de que desconheciam essa fonte de luz.

Ainda que fosse visual a luz que envolvia a base, nenhum sensor da espaçonave conseguia detectá-la.

Efetivamente estavam lidando com um fenômeno totalmente desconhecido e, no momento consideraram que o mais adequado era manter uma distância que considerassem segura, mas ambos trocariam informações no sentido de decifrar o que estava acontecendo.

Na base a estranha criatura continuava a transitar entre os seus tripulantes, aparentemente como eles agora estava buscando uma forma de comunicação.

Inesperadamente uma mensagem surgiu em todos os computadores da base e da espaçonave que tinha se aproximado: “Por favor mantenham o que chamam de motores desativados, para que seja possível auxiliá-los.”



Para todos que habitavam tanto a base quanto a espaçonave a mensagem pareceu desconexa, até onde tinham algum entendimento não estavam necessitando de qualquer auxílio, o que os estava deixando perplexos era o fenômeno que estava ocorrendo e, aparentemente este tinha sido desencadeado pela estranha criatura, que agora parecia estar emitindo a mensagem de que desejava auxiliá-los, e isso não tinha sentido.

Inicialmente por que essa criatura os tinha deixado à deriva, posteriormente ainda que tivesse influenciado em uma melhor performance de todos os sistemas, continuava a manter os motores inoperantes, oras nitidamente esse ser já tinha um entendimento da quase totalidade do funcionamento da base e, ainda assim os mantinham à deriva, sem qualquer controle em relação a um caminho a seguir.

Curiosa essa necessidade de controle que deixa impregnado aqueles que habitam o mundo das preocupações, eles praticamente não detém qualquer controle sobre o Universo que os habita, e sentem uma extrema necessidade de controlar o Universo que ocupa o seu exterior.

Talvez se um dia venham a se dar conta de que a energia e a matéria que compõe o seu Universo interior é a mesma que compõe o Universo exterior, e assim percebam que não há qualquer necessidade de controle, seja ele da espécie que for.

Provavelmente essa divisão que criaram entre os dois Universos tenha sido um dos fatores que os levaram a essa necessidade de controle, se conseguissem se sentir como um todo, como elementos que compõe esse Universo infinito, vivo, pulsante, não mais necessitem de controle e, assim, suas preocupações amenizem.

Inesperadamente receberam uma comunicação da espaçonave que se encontrava nas suas proximidades com os dizeres: “Vocês conseguiram reativar os motores?”

Ficaram perplexos e responderam negativamente, dizendo não terem entendido o por que do questionamento. Como resposta obtiveram a mensagem: “Não percebem que estão em movimento? Seus sensores não estão indicando a rota que estão seguindo? Vocês estão se movimentando lentamente, mas saíram da posição de repouso.

Todos os técnicos da base estavam centrados em fazer com que os motores voltassem a funcionar, ignorando a mensagem que receberam, provavelmente da estranha criatura e, assim, se descuidaram dos demais sistemas da base.

Não demorou para que algum técnico fosse verificar o que ocorria e assim confirmou que não mais estavam à deriva, estavam se deslocando, mas não tinham controle sobre o caminho que estavam seguindo, levaria algum tempo para que conseguissem determinar a rota que estavam seguindo, solicitaram à espaçonave que os seguissem, mas que mantivessem uma distância segura, ainda que alguns começassem a ter dúvidas sobre qual era o significado da palavra segurança.

Talvez se não destinassem tanta energia com segurança, não haveria tanto com o que se preocuparem, assim, também não haveria o por que de necessitarem daquilo que chamam de controle.

Na base à medida que perceberam que tinham perdido o controle, ainda que inicialmente a preocupação tivesse se amplificado significativamente, começaram a se ocupar para executar o que fosse necessário. À medida que se ocupavam a necessidade de controle diminuiu e consequentemente as preocupações também.



Não demorou para que conseguissem decifrar a rota que estavam seguindo, a espaçonave que os acompanhava também a decodificou quase simultaneamente, estavam indo em direção ao caminho das estrelas que unia as duas galáxias.

Ficaram perplexos, não tinha sentido, se fosse por ação gravitacional havia outros corpos celestes com maior massa nas proximidades que os atrairiam, o caminho das estrelas ainda que os fascinassem, até então tinha sido desastroso para eles, todos que tentaram seguir esse caminho foram seriamente danificados, e agora involuntariamente estavam sendo desviados para ele.

Nesse momento uma mensagem da base foi emitida a todas as outras bases e espaçonaves com os dizeres: “O equilíbrio do Universo que conhecemos está comprometido, sigam-nos pela rota que nos leva ao caminho das estrelas, caso contrário nossa existência será comprometida, mas uma vez estabelecida a rota, desliguem os motores.”

A primeira resposta que obtiveram foi da espaçonave que os acompanhava, perguntaram qual o sentido dessa ordem que estavam transmitindo aos demais, mas responderam que não estavam entendendo, não tinham enviado nenhuma ordem aos demais, estavam centrados tentando resolver o problema dos motores e agora precisavam desviar técnicos para decifrar o que os demais sistemas da base estavam fazendo.

Mais técnicos foram desviados e, assim, começaram a decifrar inúmeras alterações que tinham sido feitas nos sistemas, os motores passariam a ser uma preocupação secundária. A base aparentemente estava adquirindo vida própria e não havia motivo para que não fosse assim, ela também fazia parte desse Universo.

Emitiram uma nova mensagem a todos, pedindo que ignorassem a mensagem anterior, dizendo não entender o por que de que ela foi enviada, agora já não se moviam tão lentamente, sua velocidade aumentava gradualmente, se continuassem assim não demoraria para que os sensores pudessem mostrar o caminho das estrelas à frente.

Ainda que tivessem pedido aos demais para ignorarem a mensagem, não demorou para que outras espaçonaves dos preocupados, dado o seu funcionamento peculiar, começassem a se avizinhar na esperança de proporcionarem algum tipo de ajuda, se necessário.



Após minuciosas inspeções nos sistemas de comunicação detectaram que a primeira mensagem para que os demais os seguissem e em dado momento desligassem os motores, não tinha partido de nenhum tripulante da base e não faziam idéia de como essa mensagem pode ter sido criada e transmitida, a única explicação possível era de que tinha sido gerada pela estranha criatura que agora habitava entre eles, mas não conseguiam entender o seu propósito, pelo menos até então.

Por outro lado enquanto verificavam a procedência dessa comunicação conseguiram também decifrar parte dos arquivos que agora faziam parte de seu banco de dados, ainda descobriram um caminho que poderia levar à possibilidade de comunicação com esse novo tripulante.

O arquivo decifrado era uma decodificação de como iria ficar o Universo conhecido com o choque das galáxias que se avizinhava, se esses dados estivessem corretos todos os “preocupados” estavam correndo sério risco de entrarem em extinção, achavam que estando nos extremos da galáxia estariam seguros enquanto as galáxias se mesclavam, mas de acordo com os dados decodificados estavam enganados, aparentemente o colapso iria atingir todo o Universo que os “preocupados” conheciam.

Após análise decidiram que deveriam transmitir esses dados a todos os demais, agora se sentiam impotentes, com a tecnologia de que dispunham, mesmo utilizando a energia proveniente das estrelas não tinham como conseguir escapar do campo gravitacional exercido pela galáxia e, talvez a única alternativa possível, o Caminho das Estrelas, até então era desconhecido e suas tentativas de nele adentrar sempre foram desastrosas.

O nível de preocupação de todos aumentou sensivelmente. Os preocupados sempre tiveram dificuldades significativas em lidar com paradoxos, se os dados decodificados estivessem corretos e permanecessem na galáxia seriam destruídos e, as tentativas até então de adentrarem no caminho das estrelas pelo que conheciam poderia levá-los à destruição.

Frente a essa situação sentiram-se impotentes, logo sem controle, não conseguiam perceber que muitas vezes o não fazer pode ser a melhor solução.



Os preocupados sempre tiveram uma necessidade significativa de ter controle sobre os ambiente que os rodeavam em parte essa necessidade era proveniente de sua incapacidade de ter controle sobre o Universo que vivia dentro deles próprios, assim tentavam compensar essa deficiência criando artifícios para controlar o mundo que os rodeava, por outro lado sempre que se deparavam com algum paradoxo se davam conta de que não tinham qualquer controle seja de seus Universos interiores ou daquele que os rodeava, com isso deparavam com a própria impotência, o que ampliava ainda mais o seu nível de preocupações.

Eles tinham total incapacidade de percepção no sentido de que muitas vezes o mais importante a se fazer é justamente o não fazer, com a decodificação dos arquivos que foram inseridos pela estranha criatura que eles achavam estar controlando a base, ainda que isso nunca chegou a ser a intenção daquele ser, ficaram sabendo que o seu planeta de origem, há muito  deixado atrás pela sua ânsia de chegar às estrelas, já tinha seguido o caminho das estrelas, assim como todos os demais dotados de vida que pertenciam às duas galáxias em rota de colisão, no momento esses planetas estavam adormecidos indo para uma galáxia nova, em formação, em um local muito distante, onde não sofreriam nenhuma ameaça com o choque das galáxias que se avizinhava.

Com a interpretação dos dados perceberam que suas naves que anteriormente tentaram seguir o caminho das estrelas praticamente foram destruídas, por utilizarem seus motores na tentativa de direcionar os caminhos a serem seguidos, na realidade o que chamavam de caminho das estrelas era composto por seres vivos, iguais àquele que no momento tentava se comunicar com eles, que agora estava sendo considerado um novo tripulante na base.

O caminho das estrelas foi construído por esses seres para que toda a vida existente nas duas galáxias pudessem ser levadas para um lugar distante e não se extinguissem quando o choque ocorresse.

Aqueles que constituíam o caminho das estrelas eram compostos dos mesmos materiais e energia que compõem os sonhos, mas os preocupados, com toda a sua tecnologia tinham achado caminhos para que não mais precisassem dormir e, assim, consequentemente, também não mais sonhavam, dessa forma para se comunicar, acharam uma forma de adentrar os bancos de dados dos preocupados com a intenção de sinalizar o que iria acontecer nas duas galáxias e propiciar a sua fuga para um local onde pudessem dar continuidade à sua existência.



Ainda entre os dados que decodificaram ficaram sabendo que em breve o caminho das estrelas seria fechado, os seres que constituíam o caminho das estrelas também não podiam permanecer nas proximidades das duas galáxias em rota de colisão, se fossem seguir as sugestões daquele ser que agora habitava os bancos de dados e os demais sistemas da base, tinham pouco tempo para reunir todas as bases e espaçonaves que tinham, pelos dados de que dispunham se não fossem seguir as sugestões, seu novo tripulante os deixaria, devolvendo o que chamam de controle de seus motores e seguiria sozinho o caminho das estrelas e, esse, se fecharia por traz dele definitivamente.

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