quinta-feira, 7 de junho de 2012

O Encontro da Trilha.





Quando sentiu a presença de Franz, a única atitude de Valkíria foi desenhar junto aos seus desejos a trilha que um dia iria mais uma vez unir seus corações.

Foi nesse momento que surgiu a trilha. 

Ambos sempre foram livres, por isso, invariavelmente a trilha se encontrava disponível a eles, ela só se fechava quando esse era o desejo deles.

Em uma de suas existências, quando ainda eram crianças, foi a primeira vez que a trilha se desenhou aos olhos de Franz, quem o olhasse naquele momento diria que ele estava dormindo, provavelmente sonhando, um sonho de criança.

Na percepção de Franz, diferente da impressão daqueles que eram considerados adultos, ainda que estivesse no local onde habitualmente descansava à noite e com os olhos já fechados há algum tempo, se sentia desperto, provavelmente mais desperto do que nos momentos em que os maiores achavam que ele brincava durante o dia.

Curiosa essa percepção daqueles que se acham crescidos no mundo dos preocupados, por que será que eles acham que os menores brincam.

Franz nunca soube ao certo o significado que eles davam ao brincar, ele se sentia experimentando o mundo que o rodeava, estava descobrindo as coisas, conhecendo, comparando. 

Nessa época ele achava engraçada a postura dos maiores, alguns falavam com ele naqueles momentos de forma infantilizada, tinha a impressão de que eles o estavam imitando.

E quando participavam de suas atividades, parece que não a levavam a sério, parece que estavam lá só para se mostrar presentes.

Talvez fosse esse o significado do brincar, eram os crescidos que brincavam, talvez por não conseguirem compreender o que os menores estavam fazendo, ainda que agissem de forma que pareciam estar entendendo tudo.

Como será que podiam imaginar estar entendo alguma coisa, se nem os menores que estavam tentando decifrar algo faziam ideia do que se tratava e, invariavelmente quando Franz entendia o mecanismo dessas coisas logo se desinteressava por elas e tentava descobrir outras novas.

Muitas vezes nessas situações os maiores insistiam para que ele continuasse com o mesmo brinquedo, mas já não tinha qualquer sentido, depois que ele os compreendia e evidentemente a partir daí se dirigia a outras coisas.

Os crescidos é que tinham a peculiaridade de ficarem repetindo sempre as mesmas tarefas, estavam sempre criando rotinas para tudo, e assim sempre faziam as mesmas coisas.

Às vezes se sentiam cansados e desinteressados pelo mundo que os rodeava, mas não se davam conta que eles mesmos criavam esse desinteresse, pelo hábito de transformarem suas vidas em eternas rotinas.

Franz pensava que talvez esse fosse um dos motivos pelos quais os crescidos deixavam de crescer, a vida deles se resumia a rotinas, fazer sempre as mesmas coisas, mesmo quando perdiam o interesse por elas.

Chagavam até a passar a impressão de que não se lembravam mais os motivos pelos quais faziam sempre as mesmas coisas, as rotinas adquiriam vida própria, e acabavam por deixar de ser funções a serviços das pessoas, e as pessoas acabavam existindo em função delas.

Para Franz e muitas outras crianças que ainda não tinham perdido o contato com a sua essência, as rotinas eram enfadonhas e totalmente desinteressantes.

Para os crescidos também, mas estavam tão imersos no mundo que eles mesmos criaram e não se davam conta, que a vida desinteressante que levavam, era tão somente uma criação deles próprios.

Franz sentiu quando pararam de conversar na casa, mesmo estando com os olhos ainda fechados, as lâmpadas foram sendo apagadas, uma a uma, aos poucos o silêncio foi ocupando todos os espaços da casa.

Ficou pensando no quarto em que estava, na disposição de cada objeto, e nas sombras que formavam na escuridão em que se encontrava.

Sabia estar com a face voltada para a janela, de onde vinha um pouco de claridade, mas no lugar da janela, nos seus sentimentos se desenhou uma pequena varanda, além dela uma densa floresta ocupava o lugar da rua, onde com outros de sua idade muitas vezes passava do dia, na percepção daqueles que se consideravam crescidos, brincando.

Franz sabia que no meio da densa floresta se desenhava uma tênue trilha, sentiu seu coração pulsar forte e soube que os aborrecimentos e rotinas dos crescidos não iam fazer parte de sua existência.

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